Lembro- me de estar correndo, talvez eu corra desde que descobrir
que estava incompleta.Juntei-me a uma multidão, e o que fazíamos de
melhor era correr, passamos por muitos lugares íngremes,vales e
montanhas, com a certeza que existia algo além de tudo o que víamos.
Todos
os tipos de pessoas faziam parte da multidão, noivas e noivos ,dava pra
perceber pelas suas roupas ,mesmo sujas dava notar a linda renda que
compunha o vestido da noiva. Também tinha muitos empresários que devido a
corrida já haviam retirado seus ternos, e as gravatas vinham
penduradas no pescoço,pelas suas expressões faciais notava -se
claramente a sede de algo, a busca por realização,famílias inteiras
corriam juntamente conosco,pais,mães filhos e filhas, idosos ,cegos que
eram conduzidos por amigos e parentes, paraplégicos que eram
carregados,suas roupas surradas e algumas rasgadas mostrava claramente
que estavam nessa corrida há mais tempo do que eu.
Na verdade
nem todos sabiam o procuravam ou para onde iam. Depois de um determinado
tempo quando chegamos ao deserto o caráter de muitos foi provado, uns
desistiram ,outros conseguiram se estabelecer ali e decidiram ficar,
revelaram-se muitos inimigos,mas conheci muitos amigos.
O que
me dava esperança de chegar há um lugar seguro era a luz do céu que
diferente do sol brilhava mais forte cada vez que corríamos, aquilo era
pra mim um sinal de que não estávamos sós, que havia um propósito pra
tudo aquilo.Caí muitas vezes ,meu vestido já estava sujo demais,mas toda
vez que alguém se revelava ser um amigo e me estendia a mão, eu olhava
para o céu e simplesmente sorria.
Foi muito difícil em alguns
momentos, reclamamos e murmuramos, trapaceamos também,nossas mãos
estavam sujas pelas nossas atitudes e também pela poeira do deserto. Vi
muitos amigos ficarem pra trás, me penalizei com eles e prometi-lhes
que voltaria para buscá-los,cortava meu coração,mas era preciso.
Quando o deserto passou, paramos, retomamos fôlego e voltamos a correr, meus pés ja doíam e ficava cada vez mais difícil de
respirar, minhas vestes transpareciam como eu estava por dentro, aquela
busca louca por algo que eu nem sabia o que era, estava acabando
comigo,mas eu precisava continuar. A iluminação que vinha dos céus
entrava por entre as brechas das grandes árvores, aquecia meu coração e
fortalecia minha fé, eu sabia que estava chegando.
Quando já
nossos lábios rachados pela sede e pelas múltiplas palavras de derrota,
frustração e reclamação começaram a sangrar, meus olhos já embaçados
pelo suor impedia minha visão, até que minhas pernas simplesmente
pararam, esfreguei os olhos e o que vi superou todas as minhas
expectativas,olhei para os lados e ja não éramos muitos, mas os que
permaneceram caíram pelo chão diante da beleza daquele lugar. Agora meus
olhos estavam sendo invadidos por uma onda de lágrimas que corriam em
minha face, lembro-me de ter pensado " Valeu a pena".
Meus pés
vacilantes encontraram um lar,fui andando em direção há um grande lago
sem fim. A beleza da natureza e o cheiro das flores me fizeram ter
certeza que eu pertencia àquele lugar, sem mais esperar todos nós
mergulhamos e nos lavamos, a água em contato com minha pele era um
esfoliante natural que me fez voltar as raízes, a felicidade vinha
estampada em nossos rostos por um sorriso largo que não tinha hora para
ir embora. O sentimento de nadar,era pra mim o mesmo que voar, eu me
senti livre, as águas recuperavam minhas forças e eu pude me deleitar
naquela fontes que partiam de uma imensa rocha, quando passei a boiar
,olhei para os céus e senti como se alguém retribuísse meu sorriso de
gratidão, nem me lembrava mais das coisas passadas.
Alguns
afoitos se afogavam pensando que já conheciam àquelas águas profundas,
uns ficaram só nas beiradas bebendo do pouco que chegava na terra,
outros só nadavam na superfície ,julgando ser ali um lugar de conforto,
mas eu e uns outros poucos sentíamos que tinha mais, uma leve correnteza
nos levava em direção á grande rocha , com muito cuidado e ajudando uns
aos outros ,resolvemos passar por debaixo d'água , havia um enorme
buraco de onde vinha a correnteza e nadamos até o outro lado da rocha. A
vista era 3 vezes mais linda e pura que a do outro lado ,nadamos até a
beira e conforme íamos saindo de dentro das águas nossas vestes ficavam
mais brancas. Juntamente com com meu vestido minha alma também
resplandecia, a água não tinha apenas me lavado da sujeira que eu
adquiri por tantos anos, mas também me fortaleceu e eu passei a sentir
coisas diferentes.
Olhamos a nossa volta ,mas não havia outras pessoas, apenas cestos,
baldes e muitos recipientes de água, a princípio não tinha entendido,
mas minha visão estava sendo ampliada e como um véu que havia se
retirado do meu coração e olhos passei a enxergar tudo.
A
paisagem a nossa frente por incrível que pareça era a mesma por onde
havíamos chegado, já éramos poucos e outros ainda, por mais que tinham
entendido tudo, resolveram voltar por não concordar com a missão que nos
estava proposta.
A missão era simples, iríamos encher aqueles
recipientes com água e partiríamos novamente para o mesmo lugar,
subiríamos montanhas ,desceríamos vales, atravessaríamos dessertos mas
agora com uma motivação diferente, já tínhamos encontrado nosso lar,
nossa casa, mas devíamos ajudar outros tantos que estavam vindo pelo
caminho. A água nas vasilhas ,seria para saciar a sede e fortalecer
aqueles que se encontravam fracos e debilitados, e também para nos
fazer lembrar que de onde veio aquela tinha muito mais.
Agora
muito mais fortes não deixaríamos ninguém para trás, eu iria buscar
meus amigos que ficaram no meio do caminho e juntos chegaríamos no
lugar de repouso eterno. Coloquei minha vasilha nas costas e o peso ,não
se comparava a toda a carga que outrora, eu carregava. E cada vez que
as águas se moviam e nos molhava , limpava nossas vestes empoeiradas
novamente pela sujeira e nos lembrava de onde viemos, onde chegamos,
quem viemos ajudar e florescia o caminho por onde passávamos para nos
mostrar por onde deveríamos voltar.
Por Marcelle Santos Fernandes
0 comentários:
Postar um comentário